Nosedive e a Sociedade Rasa

Primeiramente, faz-se importante iniciar tal post com uma pergunta: Você é você nas redes sociais? O episódio Nosedive traz tal questionamento ao exacerbar, em sua obra, o quanto a sociedade afluente baseia seu progresso vazio em mera aparência. Dessa forma, a obra exibe não só a artificialidade que é colaborada na dimensão virtual, como também escracha o quanto a sociedade caminha para a impessoalidade e para relações fúteis e meramente avaliativas. Assim sendo, esse post traz um contraponto a esta maré quase automatizada, tentando mostrar claramente que, além haver um caminho melhor, ninguém precisa seguir posturas conformistas e/ou totalitaristas de vida.

Analogamente, o que está proposto neste artigo é similar ao que a Jaquelini Carnacchioni também propõe em seu post, principalmente quando diz o seguinte: “nós já avaliamos as pessoas todos os dias pelo o que elas mostram ser, sem tentarmos ao menos conhecê-las de maneira um pouco mais profunda. É tudo na base da aparência. Se tal garota é gorda demais para os padrões, ela não é vista com bons olhos. Para alguns, ela é menos atraente. Logo, menos likes na selfie (e se para essa garota em questão os likes são importantes, surge a frustração).”

Assim sendo, o poder, a fama, e também a influência geralmente baseada em preceitos fugazes, e algumas vezes até vulgares, se sobrepõem a tudo. Dessa forma, tudo aquilo que realmente vale a pena perde o sentido de ser, e não é incomum que se instalem a apatia, o ócio, e até mesmo a frustração nas pessoas que mergulham na ideia de que precisam de mais likes para serem relevantes e/ou felizes.

Mecanismo de Defesa explanado em Nosedive

Contudo, é ainda pior. Basicamente, muitas pessoas usam as redes sociais como mecanismo de defesa, uma atividade obsoleta para fugir do seu próprio vazio existencial. Por isso, elas exibem um ímpeto em obter reconhecimento por meio de likes ou comentários, se tornando reféns de um sistema. Tal sistema é estabelecido para que a pessoa se vicie nessa medida a partir de suas vulnerabilidades. E como Frankl observa em seu livro A vontade de sentido, “quanto menos se sabe aonde ir, tanto mais se quer cair na estrada”, e assim sendo, as pessoas mergulham com avidez nas redes sociais sem ‘saber onde ir”, sem refletir a respeito de toda essa artificialidade, alienando-se de si mesma e se distanciando de toda e qualquer possibilidade de enfrentar o cerne da questão, o motivo essencial da fuga, e o respectivo uso da rede social como preenchimento de tal vazio.

Todavia, este artigo traz um contraponto a tudo isso, e se revela como um mecanismo de lucidez frente a alienação, uma ferramenta para possibilitar uma reflexão frente ao todo automático. Para tanto, Nosedive será o pano de fundo. Então imaginem as ações da personagem principal Lacie, e onde culminou tudo dentro daquele futuro distópico.

Lacie vai à um café. Ao chegar lá, faz o seu pedido, e assim ganha um cookie por conta da casa. Ao se direcionar a mesa, ela imediatamente come um pedaço do cookie, e então, sorri, para depois expelir este pela boca. Na sequência, ela tira uma foto do café – incluindo o cookie mordido – e posta na rede social como se fosse a melhor coisa do mundo. Ela ganha muitas curtidas, e fica muito satisfeita com isso, mesmo tendo bebido o café na sequência e achado também horrível. Ela simplesmente mergulhou na rede, alienada à tudo, sem “saber para onde ir”

 

O Sistema em Nosedive

Em Nosedive, o sistema de curtidas, que se dá em formato de nível de estrelas (uma espécie de fusão entre Instagram e aplicativo Uber), estabelece o nível de artefatos e objetos que se pode adquirir, numa combinação entre status e dinheiro. Aparentemente o dinheiro propriamente dito ainda existe, todavia certas promoções ou certas coisas e funções sociais só podem ser alcançadas se houver também um nível de curtidas adequado a isso. Uma pessoa com baixo nível de curtidas sequer pode entrar em certos lugares, como fica claro em algumas cenas dos episódios, e também classes sociais marginalizadas evidentemente tem avaliações menores. Como se não bastasse, é obvio que pessoas “canceladas” tem uma grande queda na média de curtidas, o que significa que tudo e qualquer coisa precisa seguir o rito máximo de aparência estabelecido pela conveniência daqueles que tem as médias de curtidas mais altas.

 

O Famigerado Cancelamento

Assim sendo, no episódio, Lacie sofre uma espécie de cancelamento desde o que acontece quando ela se propõe a pegar o voo para ser madrinha do casamento de Naomi. Todavia aqui, a cena do café chama mais a atenção e serve como exemplar para a argumentação, por se tratar de um demonstrativo claro do quanto uma pessoa pode assumir uma persona completamente diferente numa rede social, e dessa forma não ser ela mesma.

A rede social pode passar uma ideia tão forte de bem estar a partir de uma imagem estática ou vídeo falso, que uma pessoa, querendo fugir da realidade ou de si mesma, passa a tentar apenas se adequar aos ditames que aquilo implica. É claro que uma pessoa consegue usar uma rede social apenas pelo divertimento, sem uma prerrogativa compensatória de algo. Entretanto, a rede social favorece para que essa configuração de compensação aconteça, e numa sociedade fria e injusta, os meios cibernéticos reforçam tudo isso, baseados em algoritmos que se propõem a isso.

 

A alienação no uso das redes – Um paralelo com Nosedive

Significa então dizer que, mediante o risco de alienação e possibilidade de mergulho viciante na expectativa dos ‘likes’, é preciso conscientemente refletir sobre o próprio uso das redes, para constatar até que ponto tal uso é apenas uma forma significativa de entretenimento, ou uma fuga que acaba reforçando um adoecimento psíquico. Seria um péssimo sinal se, após alguma reflexão, você constatasse que não consegue ficar 3 ou 4 dias sem as redes sem sentir algum tipo de frustração ou abstinência. E podem apostar que a maioria sentiria algo assim, ou ao menos um incômodo significativo. Lacie ignora seus gostos, sua própria opinião, em benefício das aparências, exatamente o que a maioria das pessoas fazem em busca de aceitação, numa postura conformista e até mesmo totalitarista algumas vezes.

É claro que, no caso do futuro distópico de Nosedive, as escolhas de Lacie tem um impacto maior devido ao fato de que seu status social é diretamente proporcional ao que ela pode conquistar. Ela só pode ter a casa dos seus sonhos se tiver uma média de curtidas suficientes para isso. Todavia, isso não está muito distante do que é a realidade atual, onde curtidas e seguidores em demasia estão alinhados com o quão poderosas e influentes pessoas possam ser, ainda que de modo indireto.

Mesmo assim, esse culto ao status anda na contramão do que é verdadeiramente valoroso na vida, e tal valor se reflete muito mais na sabedoria do coração do que coerência da razão. Isso significa que ser autêntico, vale mais do que viver uma ilusão, ainda que essa ilusão te leve a desfrutar da vida em Paris.

 

A necessidade de se buscar a comunhão

Porém, a realidade atual não é exatamente como Nosedive e, assim sendo, o impacto de ser autêntico ainda não vai te impedir propriamente de ter um imóvel de luxo. Ainda assim, não vale a pena negar o próprio ser para servir aos interesses do mundo, o que significa que, para além do que se possa obter na vida, o mais importante é estar consciente de si, reverberando suas próprias opiniões. Assim, se pode agir de forma análoga as suas convicções e seu próprio caráter.

Este artigo não se propõe a dizer que não é legitimo buscar bens, lucro e uma vida confortável. Este apenas quer dizer que tal busca nunca deve ser um fim em si mesmo, mas apenas um meio para viver uma vida com cada vez mais possibilidades de realizar significados e valores em comunhão com o mundo.

Portanto, não existirá comunhão com qualquer coisa, se tudo se basear na aparência, na artificialidade, na ilusão propriamente dita. É preciso superar o orgulho e compreender suas ações para entender qual é a função do seu comportamento e o que ele regula. É muito bom exalar felicidade através de uma foto, mas é retroativamente ruim se isso é apenas um reflexo de um vazio existencial.

 

Conclusão

Por fim, é importante salientar que, muitas vezes, o antídoto para o vazio extrapolado no uso das redes pode ser apenas não cometer excessos. Buscar o equilíbrio do uso então é importante, para não viver em função do que ainda não está nem perto de acontecer. E se existe um vício, e este é tão grande que você não consegue lidar sozinho, pode valer a pena buscar uma terapia. Embora não pareça haver nenhuma discussão coletiva a respeito do impacto do uso das redes mediante esta vertente existencial, a mudança de algo sempre começa na própria mudança de cada um. A partir disso, a esperança se renova para que a sociedade saia daquilo que é raso, e se configure na profundidade que faz jus ao que é o ser humano. Amor, reciprocidade e cuidado entre as pessoas é o mais importante, para além de qualquer aparência.

Nosedive mostra a derrocada de Lacie, mas também mostra sua renovação no final – ainda que de maneira grotesca e censurável – por ter se libertado das conveniências e ter podido ser ela mesma. Porém não é preciso chegar a esses extremos para acordar, talvez só seja preciso ler um artigo como este.

 

Referências:

Cinematecando – Post da Jaquelini Cornachioni

FRANkL, V. E. (2021). A vontade de sentido: fundamentos e aplicações da logoterapia. Paulus Editora.

 

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Nosedive e a Sociedade Rasa – Análise de um Episódio de Black Mirror
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